A QUEDA DE BERLIM (1950)

Por Felipe de Souza*

“A Queda de Berlim” (1950), uma superprodução do estúdio Mosfilm dirigida por Mikhail Chiaureli, é um marco no cinema soviético, não apenas por sua grandiosidade, mas também por sua capacidade de capturar, de forma épica e visualmente impactante, o papel decisivo da União Soviética na derrota do nazifascismo durante a Segunda Guerra Mundial, ou, como é mais conhecida pelos soviéticos, a Grande Guerra Patriótica. Com cenas de batalhas incrivelmente bem coreografadas e tecnicamente impressionantes, até mesmo para os padrões contemporâneos, o filme se destaca pela representação detalhada do protagonismo militar da URSS no conflito, assim como pela importância da figura Josef Stalin nesse processo histórico.

Um aspecto central de “A Queda de Berlim”é sua relevância política e histórica, ao destacar o papel incontestável do povo soviético na vitória sobre o nazismo. Ao longo da narrativa, o filme deixa claro que a União Soviética não foi apenas uma participante, mas a protagonista na destruição do regime nazista, algo que muitas vezes foi minimizado em narrativas ocidentais. O filme, portanto, reafirma a importância da URSS no cenário global, sublinhando seu sacrifício e contribuição decisiva para a vitória na guerra. A tomada de Berlim, momento culminante da história, sintetiza exatamente essa ideia.

A narrativa do filme se divide em dois eixos principais: o impacto da invasão alemã na URSS sobre a vida da população civil e os bastidores políticos desse momento histórico. O que confere um toque mais íntimo à trama é o romance entre Alexei Ivanov (Boris Andreyev), um trabalhador comum que se torna herói de guerra, e Natasha (Marina Kovalyova), uma professora que é vítima dos horrores nazistas. A relação entre eles serve como um símbolo da resistência soviética. O arco narrativo do casal, separado pela guerra, oferece momentos de ternura que contrastam com a brutalidade dos eventos ao redor. O amor entre Alexei e Natasha é retratado de maneira um tanto simplista, porém eficiente, marcado pela pureza dos sentimentos, sem grandes complexidades psicológicas.

O filme não demora a retratar a invasão nazista à União Soviética e a resposta heróica da resistência, culminando, no ato final, com a ofensiva sobre Berlim. A interpretação de Mikheil Gelovani no papel de Stalin é notável por seu equilíbrio e serenidade, retratando um líder que inspira confiança e união entre seu povo. Stalin é representado como o estrategista cuja visão clara e calma frente às adversidades conduz o Exército Vermelho à vitória. Embora aprecie a forma como o filme apresenta o personagem histórico, considero a representação civil de Stalin um tanto exagerada; ele é elevado a um papel quase mítico.

Por outro lado, o retrato de Hitler me desagrada. Ele é representado de forma totalmente caricatural, como um homem completamente desequilibrado, em total desordem emocional e física. Embora seja verdade que a figura real de Hitler possuía uma dimensão teatralizada e grotesca, a escolha de composição do personagem no filme tira o peso de seus atos, pois o retrata simplesmente como um lunático.

Visualmente, A Queda de Berlim impressiona pelo uso grandioso de cenários e figurinos. A reconstrução da cidade de Berlim, as sequências de batalha e o uso do Technicolor ajudam a criar um espetáculo cinematográfico que não busca apenas entreter, mas também reforçar o heroísmo e o sacrifício. A grandiosidade dos cenários, a recriação detalhada das batalhas e a reconstituição de Berlim são impressionantes. As cenas de batalha são grandiosas, capturando o espírito de bravura do Exército Vermelho em sua luta pela libertação da Europa do jugo nazista. Chiaureli orquestra essas cenas de combate com uma complexidade técnica que continua sendo admirada até os dias de hoje. As formas como os soldados se movem pelas vastas paisagens, a precisão dos detalhes em cada tomada e o ritmo das ações de guerra demonstra o nível de habilidade e coordenação envolvido na produção.

Outro destaque do filme é a trilha sonora de Dmitri Shostakovich, cujas composições elevam ainda mais a atmosfera épica. As notas orquestrais carregam a grandiosidade dos momentos de triunfo, imbuindo à narrativa de uma poderosa emoção que conecta o espectador à luta coletiva do povo pela paz e liberdade. Suas composições também funcionam muito bem nas cenas de romance, sublinhando o sentimento entre Alexei e Natasha, em contraste com a música estridente das batalhas, trazendo um lirismo ao romance que suaviza o tom épico do filme e permite que o espectador se conecte emocionalmente com os personagens.

Em última análise, “A Queda de Berlim” não é apenas um épico de guerra, mas uma celebração da vitória soviética e do sacrifício coletivo de um povo contra o nazismo. O filme se torna, assim, uma peça fundamental para entender o papel da União Soviética na Segunda Guerra Mundial. Ao tratar o protagonismo da URSS e de Stalin na derrocada do nazifascismo, o filme reafirma o papel central da União Soviética na história mundial. Em termos cinematográficos, continua sendo uma das superproduções mais ambiciosas e impactantes da época, não apenas por suas qualidades técnicas, mas também por sua relevância histórica e política. Apesar de algumas falhas na construção de personagens, o filme é essencial para nos desintoxicar da visão hegemônica que Hollywood construiu sobre os eventos da Segunda Guerra.

DIREÇÃO:  Mikheil Chiaureli

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*Cinéfilo e Membro do Podcast Cinema em Movimento

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