Audiência Pública sobre Saneamento no Litoral Norte Expõe Falhas no Planejamento

Por MOVLN*

A audiência pública realizada ontem, no Litoral Norte do Rio Grande do Sul, trouxe à tona diversas falhas e omissões no plano de saneamento básico da região. A reunião, que contou com a participação de representantes da empresa Avarvut, da Corsan e de moradores locais, revelou uma série de problemas estruturais, técnicos e sociais que colocam em xeque a eficácia do modelo proposto.

Falta de dados compromete diagnóstico

Um dos principais pontos críticos apontados foi a limitação de acesso a dados essenciais para a elaboração do diagnóstico técnico. A Avarvut, empresa contratada para a tarefa, afirmou não ter recebido informações suficientes para uma análise consistente. A ausência de dados compromete o planejamento e reforça a necessidade de transparência nas próximas etapas.

Redes priorizam condomínios e ignoram áreas vulneráveis

Outro tema que gerou indignação foi a escolha de priorizar condomínios de alto padrão na instalação das redes de esgoto, enquanto comunidades densamente povoadas e com maior vulnerabilidade social seguem desassistidas. Essa inversão de prioridades foi amplamente criticada tanto do ponto de vista da justiça social quanto da viabilidade técnica. Condomínios, inclusive, teriam condições de adotar soluções sustentáveis, como o reuso de água, ao contrário das populações que ainda carecem do básico.

Corsan retém dados sobre poluição

Foi admitido na audiência que a Corsan possui um banco de dados detalhado sobre eventos de bypass — quando o esgoto é lançado sem tratamento —, incluindo frequência, duração e qualidade da água. No entanto, esses dados não foram disponibilizados ao público, o que levanta sérias questões sobre a transparência da companhia. A mesma falta de acesso se aplica a informações sobre soluções individuais, recepção e tratamento de lodos e sua destinação final.

Modelo técnico é considerado inadequado

Especialistas e moradores questionaram a opção por redes extensas e concentradas, que demonstraram baixa capacidade de diluição. Esse modelo aumenta a frequência dos bypasses e revela uma estratégia tecnicamente frágil. Alternativas como estações locais descentralizadas (ETEs menores e adaptadas às realidades de cada bairro) sequer foram apresentadas ou debatidas com a população.

Além disso, a importância de integrar sistemas individuais de tratamento — como fossas residenciais — ao plano geral de saneamento foi ignorada, apesar de grande parte da população depender desses recursos. A gestão e regulação desses sistemas também não foi abordada.

Emissário submarino citado de forma velada

Durante a audiência, uma declaração de representante da Corsan sugeriu uma “terceira possibilidade” para a destinação dos efluentes da região. Embora não tenha sido nomeado diretamente, muitos presentes interpretaram a fala como uma referência ao controverso projeto de um emissário submarino, solução que preocupa ambientalistas e especialistas por seu potencial impacto ecológico.

Ausência de técnicos e despreparo da Corsan

Um dos pontos mais comentados foi a ausência de técnicos da Corsan especializados em saneamento. A empresa enviou representantes sem conhecimento técnico suficiente para responder a questionamentos complexos, o que frustrou parte dos presentes. Essa prática tem sido recorrente em outras audiências e reforça a percepção de desrespeito com os usuários dos serviços públicos.

Falta de articulação entre opositores

Apesar das críticas contundentes ao modelo proposto, também foram apontadas falhas na articulação dos grupos que se opõem ao plano. A desorganização nos questionamentos, a falta de divisão clara de temas e o uso impreciso do tempo de fala reduziram a força do debate. A construção de estratégias coletivas mais bem coordenadas pode fortalecer a resistência e garantir maior impacto.

Litoral Norte ainda não tem aterro sanitário

Por fim, destacou-se a ausência de um aterro sanitário regional, tema que foi apenas superficialmente abordado na audiência. Atualmente, o lixo coletado no Litoral Norte precisa ser transportado por mais de 200 km até o aterro mais próximo, gerando altos custos. Uma viagem de caminhão com 13 toneladas de lixo custa em média R$ 650, sem contar despesas com pessoal, manutenção e taxas de destinação final em aterros privados. Essa logística onerosa compromete a gestão de resíduos sólidos e exige soluções estruturais urgentes.

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*Movimento Unificado em Defesa do Litoral Norte Gaúcho

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