Brisa na Janela (Conto)

Texto e arte de capa por Emilly Nunes

Pode-se dizer que era uma noite como todas as outras e era isso que pensava um garoto, ou melhor, um garotinho que recentemente havia completado 12 anos.

A noite era chuvosa e até com alguns trovões, mas isso não o assustava pois se lembrava de sua querida mãe, lembrava de seu abraço reconfortante e gentil que o acalmava durante essas noites. Ele se encontrava sozinho, pois seu pai estava trabalhando até tarde, o que já era esperado. O pai era muito ocupado, pelo menos era isso que ele dizia a seu filho, que não tinha tempo para ele e nem para sua mãe, porque tinha que trabalhar para os sustentar. Mas o garoto nunca se importou com isso, pelo menos não desde que sua mãe havia partido.

Naquela noite, como em várias outras, ele estava mais sozinho do que nunca.

Olha através da janela e vê as gotas caindo. Joga um jogo consigo mesmo, um jogo muito divertido: ele tenta adivinhar qual gota cairia primeiro pela janela. Mas, depois de um tempo, começa a se entediar, ele olha o relógio e vê que já são 2h57min da manhã. Então ele resolve ir para seu quarto para dormir ou pelo menos tentar.

Quando ele estava nos últimos degraus para ir ao seu quarto, ele começa a ouvir alguns barulhos estranhos vindo da cozinha da sua casa. Mas ele resolve ignorar até porque, pelo conhecimento que tem em filmes de terror, ir olhar o que é sempre dá errado.

Ignorando o barulho, ele passa pelos quadros de sua “antiga família”, ele não se lembra de muitas das fotos tiradas, e olhando pra elas a única coisa que ele sente é inveja e tristeza. Inveja pelo seu eu do passado, que era feliz; e tristeza, porque nunca mais terá aquilo de novo. Ele sente saudade de sua mãe, que sempre foi seu Porto Seguro, e se sente confuso de ver que seu pai também era feliz junto dele. Mas ficar olhando aquelas fotos não fará aquilo se tornar real, então ele passa por ali e entra em seu quarto. Ele se deita em sua cama, olha ao redor e sente o vazio do seu quarto que, mesmo sendo cheio de brinquedos e coisas incríveis, nunca preencheram a falta de uma mãe e a ausência de seu pai. Ao lembrar de tudo que vem acontecido consigo, ele chora e isso é tudo que ele pode fazer… chorar e chorar bem baixinho, tão baixo que até mesmo uma formiga teria dificuldade de ouvir! Ele não quer demonstrar fraqueza, então chorar baixinho seria a solução. De tanto chorar, o garoto começa a sentir seus olhos pesarem e adormece em meio aquele vazio.

O garoto acorda um pouco suado, sente seu corpo doer e sua cabeça pesava mais que uma cidade. Ele procura seu celular para ver as horas, mas o celular simplesmente não liga de forma alguma. Então ele vai até o andar de baixo onde está o único relógio da casa. Ao olhar melhor seu quarto, ele percebe que, na verdade, aquele não é seu quarto e sim um lugar em que já estivera antes: um lugar de paredes cinza-escuro com suas paredes mofadas; uma porta à sua frente que também lhe era familiar e até nostálgica.

Em um instante, ele começa a chorar e não sabe por quê.

“O que eu fiz para estar aqui? Porque ele faria isso”?”

Ele se perguntava em desespero, tudo que queira era se livrar das “correntes” que o prendiam, queria sair daquele terrível lugar. Depois de se acalmar, ele resolve ir até a porta que já estava meio aberta, coisa que ele não havia percebido.

Ao sair daquele lugar, ele se encontrava em um corredor muito bem iluminado: eram várias estantes de porão, feitas de madeira que não acabavam mais, olhava para a esquerda, para direita, para frente, para trás, parecia não ter fim e até mesmo a porta que tinha acabado de sair não tinha um fim. Ele começa a caminhar à sua direita, sem saber a aonde ia; mas sabia que apenas deveria continuar caminhando. Ele caminha, caminha, caminha, caminha e caminha mais um pouco.

Caminha até que ouvir algo aterrorizante: um som que o fez se arrepiar até a alma e fez seus sentidos ficarem latentes caso precisasse fugir do que fizera o barulho.

Ele começa a olhar ao seu redor e tenta identificar de onde vem o barulho. Avista, lá no fundo, o criador do barulho: uma criatura que se assemelhava a uma mulher de grande porte, o suficiente para ter quase 3 metros. Ela parecia ser feita de escuridão e seus olhos eram vazios, mas ela tinha uma feição de tristeza profunda, e não parecia querer o machucar nem nada do tipo… mas, quando ela gritou novamente, todas as luzes desligaram, deixando acesas apenas as de emergência que eram muito fracas. E então aquela mulher se transformou em outra criatura que agora se assemelha a um homem de face cruel e feito de uma fumaça negra cheia intenções maldosas. A única coisa que o garoto pensou foi: “Fuja!”

E foi isso que ele fez. Correu daquele mostro que também começou a correr para o pegar.

Ele sentia o monstro chegando perto, sentia que o monstro não o perseguia com o instinto de um animal que caça sua presa, mas, sim, a raiva, ou melhor, o ódio que aquele monstro tinha por ele. Ao pensar nisso, ele acaba tropeçando em seus próprios pés, e como um pensamento súbito, ele sabe que irá ser pego. Ele se entrega, sem querer pensar no que pode acontecer, apenas fecha os olhos esperando o monstro o pegar. Ele escuta os passos da monstra? cada vez mais perto, cada vez mais alto e a cada passo do monstro?, mais raiva o monstro sente.

E quando ele sentiu o monstro a poucos passos dele, ele escuta o monstro em agonia e sofrimento, como se estivesse sendo machucado profundamente. Mas ele mantém seus olhos bem fechados, quando junto ao barulho, começa a sentir uma brisa suave como nas noites em que sua mãe se sentava na janela junto dele.

E então, ele abre seus olhos e vê que está em seu quarto, sua janela estava aberta e dela vinha um vento leve que acariciava seu rosto que, agora, estava em prantos.

“Foi tudo um pesadelo!” Foi o que ele pensa aliviado. Ele sente seu corpo doer por dentro, senta na ponta de sua cama e não diz nada, fica apenas pensando no sonho que teve.

Uns minutos depois, ele pega seu celular e vê que são apenas 3h da manhã.

Ele vai até sua janela e começa a olhar a rua pouco iluminada. Ele vê que, em seu telhado, há um pequeno gato preto, de olhos castanhos como uma noz queimada. Ele chama pelo gato, que atende seu chamado e vai até ele e aceita o seu carinho.

Nesse momento, vê o carro de seu pai em frente à sua casa.

“Há quanto tempo estava o carro ali?”

Ele se pergunta e conclui que os barulhos que ouviu, quando estava subindo as escadas, provavelmente era seu pai. Enquanto pensa nisso, o gato aproveita para entrar em seu quarto e se aconchegar na cama do garoto.

Vendo isso o garoto sorri, talvez não fosse ficar tão sozinho hoje.

Mas antes de voltar para sua cama novamente, ele desce até a cozinha tentando não fazer nenhum barulho. Ele vê que seu pai realmente havia chegado, ele estava dormindo, sentado na cadeira com a cabeça na mesa, tinham algumas garrafas de bebida a sua volta.

O garoto sobe até o quarto do pai que estava uma bagunça, pega um cobertor e desce novamente, para cobrir o seu pai. Depois de fazer isso, ele se dirige à escada para seu quarto. Quando estava a se deitar com seu novo companheiro, alguém bateu na porta dele.

Era o pai. Ele entrou no quarto do garoto e se sentou na ponta da cama de costas pra ele. Tudo que o garoto faz é olhar para seu pai.

“Como você está?”

“Bem”

“Hum…”

“Não deveria estar acordada? até estas horas, sua mãe não iria gostar”

“…”

“E esse gato? Ele é seu?”

“Acho que sim”

“Ele me lembrou dela…”

“Eu sei”

“Como você tem estado na escola?”

“Acho que já tá meio tarde…”

“Você tá certo é melhor eu ir, boa noite”

“Tchau”

O pai se levanta até a porta e a fecha.

“Eu te amo filho e sua mãe sempre vai te amar, durma bem….”

E depois do pai ter falado isso atrás da porta, o filho escuta os passos largos do pai saindo, passos que o lembravam dos do monstro, mas a diferença é que toda raiva não era mais presente.

“Eu também te amo pai….”

Assim, o garoto deita-se mais confortavelmente em sua cama, junto de seu novo gato, e adormece tranquilamente, pois seu peso não parecia mais tão pesado e seu quarto tão vazio.

E a brisa da noite, que chegava até o garoto da janela, era como sua mãe que o abraçava.

 

 

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