I Saw the TV Glow (Crítica)

Por Sthefaniy Henriques*

Existem muitas maneiras de começar a falar sobre esse filme, mas eu vou fazê-lo de um modo que vá contra a própria maré da produção: utilizando bastante clareza em minhas palavras, simplificando para que possa ser facilmente compreensível. Tendo isso em mente, já deixo evidenciado algo que acho crucial para falar sobre I Saw the TV Glow, mas que fica completamente misturado na produção: seu estilo que mescla uma linguagem mais experimental ao clássico filme adolescente, coming-of-age.

I Saw the TV Glow pode ser vista com duas premissas diferentes que compõem para além da história, do que será contado. De certa maneira, a história fala sobre uma juventude que cresceu assistindo a programas de TV que não eram adequados para sua idade. Mas o filme se estende para além da rebeldia e da nostalgia em assistir esses programas. I Saw the TV Glow fala sobre o acolhimento, o sentimento de pertencimento, o escapismo e criação de laços com o programa, principalmente entre as pessoas que sentem que não fazem parte do mundo em que vivem.

Eu menciono sobre o que é I Saw the TV Glow porque esse contexto se torna mais fácil para destrinchar sua condução. Sendo assim, o fato de dois pré-adolescentes assistirem um programa das 22h00 cria uma abordagem que flerta com o mítico, com o fantástico, com a ansiedade de algo novo, com a ansiedade de estar fazendo algo errado e tudo isso vai se refletir na imagem. Assim, a imagem vai se modificando, os vilões do programa de TV se tornam mais assustadores quando pixelados, o ato dormir se torna uma experiência pesada. O programa também se torna mais adulto quando visto pelo olhar de uma criança, no entanto, não é apenas na televisão que essa imagem se transforma, ela se transforma enquanto os pré-adolescentes assistem, quando ficam rodeados por luzes roxas que vem da TV.

Essa transformação da imagem é apenas um lado dela, o lado no qual existe uma conexão programa inadequado x adolescente. O outro lado vem do estabelecimento da conexão entre programa x adolescente. No caso de I Saw the TV Glow,  Owen fica obcecado em The Pink Opaque devido a Maddy, uma grande fã do programa. Não demora muito para percebermos que Maddy ama o programa mais do que o normal e que, nele, encara sua própria realidade, tomando coragem a partir do que ver The Pink Opaque. Não muito tempo depois, Owen também criará um laço com o programa, porém com motivos bem distantes ao de Maddy. Para Owen, o programa é um escape para não identificar seus próprios problemas. Nesse contexto, a imagem também vai se alterar. Maddy jura que vive na nova temporada de  The Pink Opaque e Owen é levado a acreditar que também está lá. Assim, a imagem se torna experimental, livre de amarras, de formalidades, afinal, se eles estão mesmo em um universo ficcional que está dentro de uma televisão, tudo é possível.

Nesse ponto, retomemos a falar sobre como essa mescla experimental x coming-of-age é muito bem executada. Ao mesmo tempo que a imagem e a trilha sonora lembrarão aos  programas de televisão da década de 1990, a diretora, Jane Schoenbrunn, ultrapassa essa abordagem saudosista e nostálgica aplicando nesses mesmos contextos novas formas de se manifestar algo. Com essa mescla, o desencantado com algo não é apenas realizado com a quebra de clímax do exibido, ele também será realizado com a imagem do personagem que assiste ao programa de tv sendo apagada repentinamente, assim como fazemos quando possuímos um controle remoto em mãos e desligamos a televisão justamente quando um plano fechado está sendo exibido. Sequências dessa maneira não faltam em I Saw the Tv Glow.

Para concluir, retomo a algo que venho batendo na tecla há alguns meses em relação, principalmente, aos novos filmes de terror. É necessário que o diferente aconteça, que novos jeitos de se fazer horror existam por inúmeros fatores e cabe a nós, críticos, estamos abertos a isso. Sendo assim, I Saw the TV Glow é um exemplo muito positivo dessa busca por inovação, por novas formas de se contar uma história.

Por enquanto, ele está longe de chegar ao Brasil devido ao desinteresse pela sua distribuição, mas fica, através das minhas palavras, meu incentivo para que busquem esse grande filme.

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*Formada em História pela Universidade Federal Fluminense e crítica de cinema. Por meio da página E O Cinema Levou (@eocinemalevou) no Instagram, discute a relação da História com o Cinema a partir de filmes.

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